Isaltino Gomes Coelho Filho
“Não vos deixarei órfãos; voltarei a vós” (João 14.18).
Platão disse, sobre Sócrates, que ao morrer deixou ele os discípulos órfãos. Jesus vai para a morte, mas faz questão de dizer que não deixará os seus nesta condição. Não se trata da parousia, sua segunda vinda. Ele voltaria para aqueles discípulos, e não em um futuro remoto. Trata-se, como alguém definiu, de uma enfania, sua manifestação nos discípulos, vindo para morar neles. Seria sua volta pelo Espírito Santo. No dia de Pentecostes, Jesus voltou para sua igreja, na pessoa do Espírito Santo. É confortador para a igreja saber que Jesus não é um vulto distante na história, tanto na passada como na por vir. É um vulto presente. O Senhor da igreja está com a igreja: “e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28.20).
Alguns “teólogos” que perderam a fé ou que se perderam em seu raciocínio, gostam muito do jogo de palavras, de brincar com elas. Parece que trocaram a teologia pela poesia, que é agradável (quando é boa), mas é distinta. No jogo de palavras, um deles disse que quando a igreja se reúne é para celebrar a ausência de Deus. O culto é apenas para evocar saudades. O Pai está distante, e o Filho se foi. Morreu e acabou. Cristãos que têm uma experiência profunda com Deus sabem que o culto celebra uma presença, a de Jesus. Ele está com a igreja todos os dias, até o fim do mundo. Sabem que o Espírito não é uma evocação saudosa ou o sentimento comunitário da igreja, mas uma pessoa viva e real.
O Espírito Santo é motivo de muita confusão em nosso meio. Para alguns, apenas uma força ou uma energia. Em certos segmentos neopentecostais, apenas um fio desencapado dando choque nas pessoas para elas gritarem e caírem nos cultos. Em certos segmentos tradicionais, um nome que traz problemas, e com o qual não se sabe lidar corretamente. Ele é Deus conosco. É Jesus conosco. É a certeza de que não somos órfãos. Fui tornado órfão, quando criança. Sem chorar miséria, afirmo que é uma das mais angustiantes sensações. Abandono, falta de rumo, incerteza de como será a vida, de como sobreviveremos emocionalmente. O mundo desaba para uma criança que experimenta a orfandade. Mesmo que ela ganhe uma madrasta ou um padrasto muito bons, que a tratem muito bem. Mas nunca substituirão o pai ou a mãe quando esses foram bons. A igreja não experimenta esta sensação. Ela tem a certeza de que nunca está órfã, e que nunca experimentará o abandono nem terá a insegurança. Tem um Pai presente.
O cristão não é um órfão. Se você crê em Jesus, não é um menino de rua. Convivi com alguns deles, ao longo de meu ministério, e vi a dor e a desestruturação de não ter um genitor que cuide. Nós temos. Nosso Pai cuida. Nosso irmão maior, como Hebreus 2.11 alude a Jesus, não se envergonha de nós.
Seguir a Cristo é ter certeza de uma vida com rumo. É ter um Salvador presente. Adorar a Cristo não é ter saudades, mas celebrar a presença mística do Senhor da igreja com seu povo. Se você pertence a Cristo, não é um coitado nem um largado. Ele o trouxe para a casa do Pai. O Pai o adotou. E ele, Jesus, o irmão mais velho (novamente citando Hebreus) estará sempre com você.
Por isso cabem aqui as palavras do grande Gióia Júnior, que musicadas pelo também grande Marcílio de Oliveira, nos deram o hino 355 do HCC: “Aflito? Por que aflito? Cansado? Por que cansado? (…) Descansa em Deus o cuidado, põe nele tua esperança e vai dormir descansado, como dorme uma criança, como dorme uma criança”.
Descansa, aflito. Tu não és órfão!